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Discurso de Formatura

  • Foto do escritor: Carlos Neiva
    Carlos Neiva
  • 13 de set. de 2021
  • 5 min de leitura

No dia 29 de Abril de 2016, em Anápolis-GO, houve a Colação de Grau das turmas de 2015 de Geografia, História, Letras e Pedagogia da Unidade de Ciências Socioeconômicas e Humanas da Universidade Estadual de Goiás (UEG-UCSEH). Nessa ocasião, os alunos deveriam escolher dois oradores para representar as quatros turmas: um discurso para História e Geografia e um para Letras e Pedagogia. O segundo discurso coube ao curso de Letras, que elegeu-me unanimemente a mim como orador. O texto abaixo é o mesmo discurso que foi proferido naquela memorável noite.

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DISCURSO DE FORMATURA DAS TURMAS DE LETRAS E PEDAGOGIA


Se me perguntarem o que está se passando no meu coração e no coração de cada um dos formandos aqui presentes, só poderia o responder com uma pequena estória.

“Numa toca no chão vivia um hobbit...”. Sim, em uma toca no chão vivia um pequenino ser em um mundinho tão pequenino quanto sua estatura. Esse hobbit podia viver a sua vida habitual próximo daqueles que amava, e detestava, mas rodeado daquilo que lhe era conhecido. Mas um dia, um mago, de chapéu pontudo e barbas longas, apareceu em sua porta com uma caravana de treze anões para lhe convidar a sair em uma jornada.

Bilbo Bolseiro, pois esse era o seu nome, então partiu em uma aventura que mudaria completamente a sua vida. Ele veria criaturas horripilantes como trolls ou dragões, mas também criaturas belas como os elfos. Enfim, participaria de uma batalha épica e voltaria a sua casa, com um estranho sentimento de que sua toca parecia menor do que antes.


Creio que todos nós que aqui estamos vestidos de beca somos Bilbo Bolseiro. Cada um com suas motivações, dificuldades, superações, auxílios e receios, mas todas elas foram partes integrais de nossa jornada. E, agora no fim, sentimos que vimos muitas coisas e não somos mais os mesmos, ou ao menos o mundo a nossa volta não é.


O conhecimento e a aprendizagem têm dessas coisas, abrem nossos olhos a realidade e não permitem que voltem ao tamanho inicial. Mas para isso é necessário que haja uma busca esforçada, um combate de ideias, pessoas dispostas a nos ajudar e coragem para prosseguir.


Todos nós transpiramos muito para chegar aqui. Cada um conhece a sua luta, mas houveram colegas que particularmente nos inspiraram. Sinto um especial orgulho daqueles que não são da cidade, mas viajavam todos os dias para ir à faculdade. Muitas vezes acordavam de madrugada para estar presente nas aulas (é claro que a base de muito café, elixir dos universitários), mas estavam lá.


Também dou meus parabéns aos que trabalhavam no contra turno. Até hoje não sei como vocês arranjavam tempo para conciliar tudo com os muitíssimos trabalhos e tarefas. Essa vida dupla de aluno e trabalhador com certeza transformou vocês em profissionais melhores e excelentes apreciadores de cada minuto do dia.


Cumprimento inclusive aqueles que tiveram dificuldades em suas famílias. Não é nada fácil se concentrar em aulas como de fonética e fonologia com a atenção em casa. Muitos dos presentes perderam entes queridos, enfrentaram doenças suas e de familiares, problemas domésticos, problemas financeiros e até rompimento de relacionamentos. Esses são obstáculos árduos, pois não dependem apenas da força de vontade pessoal, mas que bom que vocês superaram.


Mas se embates travados para ir à faculdade são difíceis, mais difíceis são aqueles que se travam dentro da própria sala de aula. E foram muitos as discussões, ao longo desses quatro anos, das mais amistosas às mais enérgicas. Ora, “isso acontece nas melhores famílias”. E essas discussões nos permitiram adentrar nas realidades de cada um, tornando-nos mais tolerantes e compreensivos, quebrando nossos conceitos ou fortalecendo-os. Agradeço a cada um pelos inúmeros debates, que, muitas vezes, fui eu a iniciar. O importante é que foram desses confrontos que nasceram grandes amizades.


Bom, foram muitos os dragões e trolls a se enfrentar. Faço memória a todos os colegas que não prosseguiram por causa dessas dificuldades, vocês podem não estar hoje conosco, mas foram importantes para chegarmos aqui. Além deles, agradeço de coração cada um daqueles que agiram como “nossos elfos” a dar auxílio e repouso.


Agradeço aos nossos familiares pelas ajudas financeiras e o apoio, mesmo que a contragosto. Particularmente, agradeço ao meu querido pai por cada risco de vida que correu nas estradas desse país, para me dar as condições necessárias para caminhar, mesmo que não estivesse contente com minha escolha de curso. Nossos agradecimentos também cabem aos nossos amigos, que serviram de providente arrimo. Como bem eternizou Vinícius de Moraes, não poderíamos nem mesmo sobreviver sem nossos amigos.


E o que seriam dos estudantes sem seus professores? Ninguém aqui pode ter dúvidas do quanto eles foram essenciais para as vitórias que se celebram nesse dia. Aos nossos queridos mestres, com carinho, queremos agradecer por todas as aulas, por todos rabiscos complexos no quadro, por todos os trabalhos e seminários marcados por acaso na mesma semana, por todas as provas imensas, por todas as correções severas, por todas as piadas, por todos os sorteios de livros, por todos os conselhos... e por toda a amizade. Sem dúvida, cada professor marcou nossa história, e aprendemos bastante com eles, tanto do conteúdo dado, como do modo de ser profissional e amigo. Nossas festinhas e confraternizações evidenciaram bem isso.


Agradecemos ainda os demais funcionários da UEG e proximidades, que com seu trabalho cotidiano marcaram a vida de muitos. Desde os donos das lanchonetes e atendentes do posto, até as “tias” da limpeza e da biblioteca, que sempre foram muito solícitos ao fazerem seu trabalho, com um sorriso no rosto.


E como um bom hobbit, agradeço ainda a Eru-Illúvatar, pois com toda certeza Ele nos conduziu bem e nos deu forças nessa jornada.


Diante do sucesso dessa batalha e da alegria do dia de hoje, vemos claramente a lição ensinada pelo escritor britânico Gilbert Keith Chesterton, ao afirmar que contos de fadas são verdadeiros não por afirmarem que dragões existem, mas por afirmarem que dragões podem ser derrotados. De fato, dragões podem ser derrotados e foi exatamente o que fizemos.


Ao mapear os mares, os navegadores do século XVI costumavam escrever a máxima “There Be Dragons”, isto é, “Encontrarás dragões”, para demarcar mares ainda não navegados e mapeados, deixando ao viajante a liberdade para se arriscar. Cada um de nós foi apresentado a essa máxima durante esses anos, mas o importante é que continuamos de velas estiradas e adentramos esses mares.


Feita uma aventura de tamanha magnitude, voltamos a nossas tocas de hobbit. Entretanto, a toca parece ser mais apertada, a lareira quente demais, e o colchão muito mole. O que será que aconteceu? Não é a mesma toca que abandonamos para seguir com a caravana de Thórin, escudo de carvalho? Sim, é exatamente a mesma toca, mas nós não somos mais o mesmos hobbits que saíram por aquela porta redonda. Esses anos dedicados no estudo de Letras e Pedagogia fizeram de nós pessoas maiores do que éramos.

Estivemos juntos por muito tempo, mas agora cada um vai seguir em uma nova aventura. Muitos aqui serão professores, e marcarão a história de tantos outros pequenos hobbits. Alguns caminhos se distanciarão e outros se cruzarão, mas ao tecer da trama do destino teremos uma certeza, de que todos somos vitoriosos, e se o somos, é porque tivemos o auxílio de cada um dos aqui presentes.


Bom, hoje comemoramos e agradecemos. Amanhã voltamos a trilhar nossos caminhos. A mensagem que pretendo deixar hoje é essa: alegria, gratidão e saudades. E são esses três sentimentos a prova de que tudo valeu muito a pena.

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