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10 Ensinamentos sobre Livros

  • Foto do escritor: Carlos Neiva
    Carlos Neiva
  • 22 de dez. de 2023
  • 9 min de leitura


Quem me conhece sabe que sou um bibliófilo, isto é, uma pessoa apaixonada por livros. Desde minha adolescência, fiz o firme propósito de ter minha própria biblioteca e, desde então, venho comprando e lendo bastante livros.


Desde então, os livros passaram a fazer parte do meu dia-a-dia, são como amigos que me acompanham, às vezes, quando fico triste, vou até a companhia deles e me consolo. O melhor amigo do homem é o livro, e me diga que livro lês e eu te direi quem és.


De fato, as pessoas são definidas pelo tipo de livro que leem, por acreditar nisso, adoro ver o que as pessoas estão lendo. Talvez por imitação de um professor de sociologia que fazia isso. O fato é que se você está lendo esse texto, é porque se interessa por livros, por isso, quero compartilhar dez frases sobre livros que ouvi ou li. Cinco delas são de professores que tive, quatro são de amigos e uma de um escritor. Cada uma dessas sentenças me marcou profundamente, e o motivo trago aqui.

 

1- "Livro rabiscado é livro estudado!"

Essa frase foi dita pela minha professora de espanhol do ensino médio. O tempo me ensinou que ler sem ter um lápis em mãos é uma grande perda de tempo. O motivo? Simples, ler não pode ser um processo passivo. O autor escreve, o livro fala e eu, como leitor, devo dialogar com eles. Por isso o lápis, é com ele que vou dar minha opinião, vou fazer relações vou concordar e discordar, vou frisar o que é importante. As anotações de uma pessoa em um livro são fundamentais no processo de leitura, por isso tem livros que a gente precisa ter livro de papel, impresso, na mão. O livro não é um professor, mas um amigo. E quando lemos, estamos mantendo o diálogo.


Mas será que todo livro deve ser rabiscado? Talvez nem todos. Mortimer Adler afirmou “Que triste seria fazer anotações num romance policial” e eu tenho para mim que a ficção não precisa ser rabiscada, mas vivida, que o leitor pode se calar e desfrutar do espetáculo da leitura, mas isso é discussão para outro texto, então vamos a próxima frase.

 

2- "Já leu suas cinquenta páginas diárias?"

Essa frase é dita por um professor amigo meu que insiste nessa meta absurda nas redes sociais. Certa vez, lhe perguntei se ele mesmo seguia o que pregava, ele respondeu que nem sempre, mas que aquilo o ajudava a ter uma meta diária. Meta diária! Sim, um hábito de leitura só se constrói com leitura diária. É preciso ler todos os dias. Ler é prazeroso, mas pode exigir que se crie uma meta e esse ritmo pode parecer difícil no início, mas logo se tornará agradável.


Eu sempre digo aos meus alunos para que leiam um livro por mês. Um livro por mês! Basta dividir o número de páginas do livro escolhido por trinta dias e touche!, teremos uma quantidade de páginas menor do que cinquenta para ler. Mas é preciso lê-las. Diariamente, essa constância transforma-se em pilhas de livros lidos.

 

3- "Você não tem medo desse livro mexer com você?"

Um amigo me fez essa pergunta certa vez, preocupado se a leitura daquele filósofo ateu não feriria minha crença no Deus Todo-Poderoso. Bom, se os livros não são outra coisa senão amigos, então é claro que “mexem” com a gente, que nos influenciam. Livros ruins existem aos montes e eu pessoalmente disponho de alguns em minha biblioteca, e eles ficam lá, parados por serem ruins de diferentes maneiras. Tem livros inspirados em jogos de videogame que eu odiei ler, tem livros da Jane Austen e do Eça de Queiroz que não suportei terminar e tem livros de filósofos ateus, todos eles são meus amigos também. Quem não tem um amigo “errado”, chato ou inconveniente que atire a primeira pedra.


Assim sendo, é compreensível a preocupação desse amigo anônimo em que os livros mexam comigo. Tenho um outro conhecido que diz que a vida é muito curta para se perder com livros ruins. Eu, porém, digo que a vida é muito curta para não se perder tempo com livros ruins. O processo de leitura de um livro ruim traz seus aprendizados, ajudam na crítica e auxilia na devida apreciação de bons livros. Além do mais, repito, quem não tem um amigo ruim e mesmo assim suporta seus defeitos. Como disse Jorge Luís Borges que será mais à frente citado sobre o filósofo político Benedetto Croce: “nem sempre estou de acordo com ele, mas sinto seu encanto”.


E por que não ser influenciado? Sua concepção d emundo é tão frágil que não suporta uma leitura contrária? Ouvir alguém que pensa diferente vai abalar seu mundinho? A mim, não. E se abalar, talvez meus dragões não sejam outra coisa senão moinhos.

 

4- "Eu parto de um pressuposto de que livro não se joga fora."

Essa frase veio da minha professora de filosofia, uma das melhores professoras que já tive. Tal afirmação casa bem com o que foi dito anteriormente. Essa frase foi proferida no dia que levei a professora para selecionar os livros da área dela que fossem úteis. Era uma tarefa que tinha sido incumbida a mim pela direção. E aquela mulher simplesmente não selecionou nada, como marcou minha memória para sempre.


Livro não se joga fora, pois ele sempre vai ter seu valor. Mesmo que tenha um conteúdo que possa ser taxado como herético ou ruim, é preciso lembrar que até um relógio quebrado está certo por duas vezes ao dia.


Aliás, livros também não deveriam ser queimados. Toda queima de livro é, intrinsecamente, um ato despótico. Quando os muçulmanos queimaram a Biblioteca de Alexandria em 451, aquilo foi um ato de despotismo islâmico teocrático; quando a igreja católica criou o De Libris, aquilo era um ato despótico católico; quando os cristãos, católicos e protestantes, fizeram inquisição de livros, aquilo era um ato despótico cristão – satirizado, inclusive, na obra Dom Quixote de la Mancha –; quando o terceiro reich queimou livros, aquilo era claramente um ato despótico.


5- "Muitos desses livros são só para consulta."

Lembra que eu disse que sonhava em ter uma biblioteca só minha? Então, essa vontade veio por causa de um professor que tinha uma boa coleção de livros. Eu, uma vez, o perguntei se já tinha lido tudo e ele respondeu com essa frase. Por que insistimos que todos os livros precisam ser lidos? É claro que não, os livros são uma extensão da nossa memória e da nossa imaginação (pensamento), os dois corvos de Odin. Ter uma boa biblioteca não é equivalente a ter uma prateleira de missões concluídas, mas ter um arsenal de tomos que podem ser utilizados quando necessário.


E todo bom leitor sabe que para cada livro lido, dois ou mais entram na fila de leitura. O hábito de ler é um monstro imbatível como a Hidra de Lerna. Pessoalmente, já abracei para mim que vou morrer sem ter lido tudo que queria, mas foi essa vontade de ler tantos diferentes livros que me manteve vivo.

 

6- A companhia dos mortos.

Em algum livro que não me lembro qual e nem consigo encontrar onde marquei, li que Jorge Luís Borges ao ficar cego, não se desfez de seus livros, mas dizia gostar da companhia deles ali. E que mesmo quando enxergava não precisava lê-los todos, mas que os tendo ali, era como se tivesse junto de si todos aqueles mortos sábios lhes fazendo companhia.


Os livros são amigos muito sábios, trazem vivências de pessoas muito mais velhas, de tempos mais difíceis. Caso os abramos, encontraremos conselhos incríveis, mas caso os mantenhamos fechados, eles ainda estarão com sua presença grave sobre nós.


Um exemplo disso é o livro de artigos do professor Olavo de Carvalho compilado pelo Felipe Moura Brasil, intitulado O mínimo que você precisa saber para não seu um idiota. Esse livro tem na lombada a palavra “IDIOTA” escrita em letras garrafais. E esse impropério fica a gritar em minha cabeça sempre que vejo o livro – já lido – ali na estante. É como se o falecido professor estivesse me ofendendo e ordenando que eu busque uma vida intelectual, como ele faz no conteúdo deste livro.


7- "Todo bom leitor sabe como organizar sua biblioteca."

Certa vez me ofereci para ajudar um amigo de mudança a organizar seus livros, e a recusa na ajuda foi feita com essa frase. Ele estava certo, a organização dos livros deve ser feita pelo dono da biblioteca e de uma maneira que seja interessante para ele e apenas ele. Conheço um amigo que catalogou seus livros com o código CDD de bibliotecas públicas, mas também conheço outro que ordena os livros por tamanho. Quem está certo? Todos e nenhum. A biblioteca de alguém deve ser organizada de acordo com a ordem que ela estabelecer para si.


Um bom teste para saber se a organização está correta e imaginar um cenário no qual falte luz ou você esteja vendado. Consegue pegar o determinado livro X? Se sim, é o que importa.

As pessoas ainda gostam de separar os livros por tipos, nesse caso, fica um questionamento. Os livros que você dispõe em sua biblioteca são, em sua maioria, sobre sua área de atuação profissional? Por que caso livros de lazer ou espiritualidade se encontrem em maioria, fica um questionamento sobre o tipo de pessoa que você é, alguém que leva uma vida intelectual puramente de lazer ou alguém muito religioso, mas cujo saber não se dá de maneira prática na sua razão de ser no mundo, na sua vocação.

 

8- "Eu prefiro a companhia dos livros do que a companhia das pessoas."

O professor que disse isso soou extremamente pedante para o público que ouvia sua conferência. O coitado passou uma ideia negativa que o sujeitinho que postou uma foto dizendo que o livro que ele mais lê são pessoas não passou. As pessoas são sociáveis em sua maioria e não veem com bons olhos quem almeja a solidão.


Felizmente, todas as pessoas estão erradas e o conferencista que disse essa frase tem minha defesa. Os livros são pessoas mais sábias, com mais conteúdo. Existe muita gente vazia por aí, sem profundidade alguma, os livros pelo menos tem conteúdo. Dizer isso não é odiar as pessoas, ora, os livros são escritos por pessoas.


Por isso, proponho o meio termo, não o intelectual schopenhaueriano, mas alguém que aprende dos livros e leva essa profundidade para as gentes vazias por aí. Aliás, dá para julgar bastante o nível de uma pessoa pela biblioteca que ela tem. Diga que livro lês e te direi quem és.


9- "Tenho livros espalhados por toda casa, da biblioteca até na cozinha."

Acho que essa frase de um professor da faculdade meu é a resposta para o problema levantado na frase anterior. Os livros não são um artigo luxuoso que compõe um claustro no qual o leitor se isola do mundo. Não! Os livros devem fazer parte do cotidiano do leitor, estar presente em todos os aspectos da vida, assim como – no caso desse professor – estão em todos os cômodos da casa.


Bons leitores falam de livros sem ver, dão livros de presente e ganham também, carregam um livro sempre consigo.


Inclusive, esse é o segredo para um bom hábito de leitura, sempre carregar um livro consigo. Nunca se sabe quando haverá uma fila de espera, quando a bateria do celular vai acabar ou quando se terá um tempinho livre. O bom leitor anda sempre armado, sacando o livro a tiracolo para ler e cumprir sua mete de páginas diárias.


Se os livros fizerem parte da vida do leitor, então esse poderá ficar tranquilo quanto a educação dos filhos. Crianças imitam os hábitos dos alunos. Crianças que leem é porque têm adultos leitores por perto. Uma casa onde os livros fazem parte do cotidiano, a criança verá os livros como parte essencial da vida. Tudo bem que nos primeiros anos de vida ela rasgue os livros, mas com o tempo ela mesma adquirirá o zelo por eles, assim como vê os adultos fazendo.

 

10- "Um especialista é alguém que leu dez livros sobre o assunto."

Para fechar com chave de ouro, uma frase de uma das pessoas mais geniais que conheço, meu orientador do mestrado. Vejo muitas pessoas que leem um livro sobre um determinado assunto e se sentem o bastião da moralidade e da sabedoria. Acredito que para alguém se considerar especialista no assunto, deveria ler uns dez livros sobre aquilo primeiro, depois imprimir sua opinião especializada. Se não, cale-se.


Por isso, deve ser instituído o voto de pobreza de opinião. Sem medo de ser feliz, os leitores deveriam se eximir de palpitar sobre coisas que não tenham lido ao menos dez livros sobre dizendo “Não sou capaz de opinar...”. Assim teríamos leitores mais sábios, e sábios mais leitores.


 

Esses foram os ensinamentos sobre livros que aprendi ao longo da vida e que sempre tenho em mente na busca de praticar. Espero que tenha sido útil para você, meu leitor. Desejo que você se torne um leitor melhor com esses conselhos e possa, enfim, carregar contigo também as lições que aprendi ao longo de anos. Afinal, não é para isso que a leitura serve, para nos ensinar de uma vez o que alguém aprendeu por anos? Talvez seja por isso que leitores são sábios, porque andam acompanhado de pessoas vividas de conselhos valiosos, algumas de capa dura, outras luxuosas e umas até tão amareladas que parecem ser de uma outra época, onde tudo era mais fácil e mais romântico.

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